O grande paradoxo: a escravidão que liberta – VI
(Conclusão do post anterior “Fazer tudo por Maria, com Maria, em Maria e para Maria – V”)
Como conclusão das presentes considerações, cabe lembrar o paradoxo evangélico segundo o qual o homem deve perder a sua vida por Cristo para salvá-la (cf. Lc 9, 24). Ou, por outras palavras, a necessidade de aniquilarmos a nós mesmos, assumindo a condição de escravos, para termos “o mesmo sentir e pensar que o Cristo Jesus” (Fl 2, 5).
A escravidão de amor, aquela praticada pelos justos e pelos santos, outorga a plenitude da verdadeira liberdade. E é este um dos pontos mais entusiasmantes da doutrina montfortiana: nossa total entrega a Jesus, tornada efetiva pelas mãos de Maria, constitui o meio mais poderoso para nos liberar do jugo dos vícios, dos nossos pecados atuais e dos efeitos do pecado original.
Da glória que traz esse paradoxo para quem o pratica, é Nossa Senhora paradigma perfeito. Pois Aquela que quis ser apenas a escrava do Senhor, “terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial”. (26)
A mais íntima união com Maria que uma criatura possa jamais obter
Ora, ao conceber a sagrada escravidão a Jesus pelas mãos de Maria, explica o professor Plinio Corrêa de Oliveira, “São Luís Grignion não teve a intenção de excluir o apelativo de filho; ele acumula ambos. É por nos sentirmos filhos de Nossa Senhora, e por reconhecermos n’Ela, além de uma Mãe perfeita e incomparável, a Mãe de Deus, que a este título somamos à condição de filhos também a de escravos”. (27)
E o líder católico brasileiro – cuja vida foi, do início ao fim, o mais belo ato de louvor a Maria que o autor destas linhas teve oportunidade de conhecer – conclui dizendo: “Não se trata apenas, no ato de escravidão a Nossa Senhora, de se conseguir uma união muito íntima com Ela. Trata-se de obter a união mais íntima que uma criatura, nas nossas condições, possa jamais obter. É a nota característica da devoção de São Luís Grignion. Não se pode dizer apenas que é um método de união muito estreito a Maria Santíssima. É muito mais. Por muito que esforcemos nosso espírito, não descobriremos um método de união que vincule mais uma criatura a Nossa Senhora”. (28)
RECOMPENSA DEMASIADAMENTE GRANDE
Quais são as vantagens dessa união?
A resposta vem por si. Basta considerar quem é Maria. Ela é nossa Mãe e, ao mesmo tempo, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.
“Como nossa Mãe, Ela usa para conosco, se fosse respeitoso dizê-lo, de todos os preconceitos, parcialidades e parti-pris que uma boa mãe tem em relação a seu filho” (29), chegando nesse amor materno quase que à fraudulência, como fez Rebeca em relação a Jacó.
Sendo também Mãe Perfeita do Filho Perfeito, a recompensa que Ela dê ao nosso amor só pode ser também perfeita, proporcionada, não ao valor do que Lhe demos, mas à generosidade d’Aquela que o recebeu. “Ego protector tuus sum, et merces tua magna erit nimis” – “Eu sou o teu protetor e tua recompensa demasiadamente grande” (Gn 15, 1), afirmou Deus a Abraão. O próprio Cristo, que quis tomar a forma de escravo no seio virginal de Maria para nos liberar do cruel cativeiro do demônio, há de ser o prêmio inefável da sagrada escravidão de amor.