Vistas finas
É conhecida a expressão “fazer vistas grossas” para significar a atitude de não querer ver aspectos de algo e sobretudo de atitudes. Costuma-se ouvir, por exemplo: Fulano fez vistas grossas ao fato de que tal pessoa tinha tais ou quais defeitos.
Há uma virtude oposta a essa atitude; constitui ela uma verdadeira riqueza para quem a possui.
O ter “vistas finas”, ou seja, perceber grandes consequências em indícios aparentemente pequenos. Esse dom, quando aplicado a assuntos elevados pode ser de grande proveito para si e para o próximo.
De autoria do Mons. João Clá, Fundador e Superior dos Arautos do Evangelho, a análise que transcrevemos a seguir, além de muito esclarecedora, mostra-nos o como se pode deduzir certezas de “pequenas” passagens do Evangelho e da Sagrada Escritura em geral. É uma questão de ter “vistas finas”.
Pelo teor do artigo, aliás pequeno, vê-se que brotou de um coração extremamente admirativo daquele a quem Deus quis chamar de Pai.
A provação de São José
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
Por ocasião da Encarnação o anjo revela que Maria será a Mãe de Jesus por obra do Espírito Santo, sem concurso humano.
Começava aí a provação de São José.
De acordo com os costumes da época o matrimônio israelita era constituído por dois atos distintos: esponsais e núpcias. Assim, ao afirmar que Maria “estava prometida em casamento a José e, antes de viverem juntos, Ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo”, o Evangelista situa o momento da Encarnação do Verbo no período posterior à cerimônia do compromisso, mas antes de Maria ir habitar na casa do esposo.
Alguns meses depois, eram visíveis os sinais da gestação do Menino Jesus. Contudo, Ela nada disse ao esposo. E ele nada perguntou…
São José era justo, frisa o Evangelista. E diante dessa Virgem que lhe fora dada como esposa, tomou uma atitude humilde e admirativa. A santidade da Virgem Maria era inquestionável. Todavia, também evidente e inexplicável era a realidade. Ele compreendeu que se deparava com um mistério e aceitou sem reparos os desígnios divinos que não entendia.
E, diante do inexplicável, José quis fugir, abandonando a esposa grávida, subtraindo-se assim às obrigações impostas pela Lei. Deste modo, assumiria sobre si a infâmia de ter abandonado sem motivo a esposa inocente e o futuro filho. Foi esta a sua escolha.
Bem se compreende que ele tenha resolvido abandonar Maria “em segredo”, a fim de pô-La a salvo de qualquer suspeita. Mas, por que ocultar-Lhe essa decisão? Somente um extremo de delicadeza pode nos explicar esse silêncio: receava colocar sua Esposa na contingência de expor-lhe aquele mistério que ele, por humildade, julgava não ser digno de conhecer.
José então foi dormir com a disposição de no dia seguinte partir às ocultas. Então um anjo do Senhor lhe aparece em sonho e diz: “José, filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque Ela concebeu pela ação do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois Ele vai salvar o seu povo dos seus pecados” (Mt 1, 20-21).
As palavras do anjo a São José confirmavam de modo irretorquível estar se cumprindo naquele momento a profecia feita por Isaias “Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um filho…” (Is 7, 14).
Bem podemos imaginar que, vencida a provação, ao acordar de manhã foi São José logo adorar a Jesus Cristo no seu primeiro e mais santo Sacrário: Maria Santíssima. Deus tinha Se encarnado e ali estava, sob sua guarda! Ele já não mais poderia olhar para Nossa Senhora sem adorar o Deus-Menino entronizado naquele incomparável Tabernáculo.
Sem dúvida São José, depois de atravessar, com admirável paz de alma, um terrível e lancinante sofrimento, teve a consolação de, depois da Santíssima Virgem, ser o primeiro adorador do Deus Encarnado.
[Transcrito do Boletim “Maria Rainha dos Corações”, nº 56, novembro/dezembro de 2011, pp. 4-5]
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