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Como um astro luminoso

Autor – Douglas Wenner

Sobre o Canto Gregoriano, comentava o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira: “Assim é o gregoriano: a música que tem a qualidade incomparável de exprimir a atitude perfeita, o exato grau de luz da alma reta e verdadeiramente inocente quando se coloca diante de Deus. Cântico do murmúrio, música da alma inocente, dessa inocência que, aliada à Graça Divina, construiu as maravilhars de uma civilização “gregorianizada”. Procure ter o seu temperamento no estado de espírito do canto gregoriano e terá encontrado uma via certa para a santificação!” 

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Quando temos diante de nós um céu bem estrelado, e venturosos admiramos os astros que ali estão a brilhar, é ou não é verdade que, por vezes, somos pervadidos pela seguinte expectativa: “será que verei uma estrela cadente?” E não é para menos, pois tal fenômeno cósmico raramente acontece.

Entretanto, imaginemos que isso se desse – caso possível fosse – ao revés. Ou seja, não presenciássemos o desaparecimento, mas o surgimento de uma estrela! Bem podemos pensar que magnífico seria se, a compassados instantes que olhássemos para a abóbada celeste, deslumbrássemos um novo astro luminoso.

Pois bem, analogamente, a cada momento que tomamos conhecimento de algum episódio relacionado a um santo, nada mais é do que um novo brilho que cintila no “firmamento de nossos corações”, convidando-nos à pratica do bem.

São Gregório – Catedral de Colônia – Alemanha

Destarte, propõe-se contemplar a vida de São Gregório Magno (540), cuja festa hoje celebramos, toda palmilhada de “constelações de virtudes”, capazes de iluminar a todos os que quiserem ser banhados pelos raios de luz tão esplêndida, cujas magnificências serão relatas no presente artigo (ao menos, algumas delas).

Viveu ele no século VI, época permeada de terríveis conturbações, merecedora por suas próprias palavras desta afirmação: “Sou obrigado a… gemer sob as espadas dos bárbaros invasores e temer os lobos que rondam o rebanho sob minha guarda”. Ou ainda:“Estou disposto a morrer antes de ser causa de ruína para a Igreja de Pedro. Acostumei-me a sofrer com paciência; mas, uma vez decidido, lanço-me com ânimo resoluto em direção a todos os perigos”. (1)

Eleito Sumo Pontífice no ano de 590, sendo antes Prefeito de Roma, empregou seus contínuos esforços em busca da propagação da Fé Católica, tendo por leit motif o desenvolvimento do monacato, confiado aos beneditinos, com vistas à formação de monges capazes de cristianizar, futuramente, vastidões inimagináveis!

Sobre o fruto dessa ação evangelizadora, comenta-nos Montalembert que: “Eles os farão instrumentos do bem e da verdade. Ajudados por esses ‘vencedores de Roma’, levarão o império e as leis de uma ‘Nova Roma’ muito além das fronteiras que o Senado fixou ou que os Césares imaginaram”. (2)

Como dado histórico que também nos confirma seu ímpeto no referido engenho, fundou ele mesmo sete mosteiros com a herança que lhe coubera após a morte de seu pai, um poderoso Senador.

Outro fato que marcara a existência deste varão, deu-se ainda antes mesmo de ocupar a Cátedra de Pedro. Grassava em Roma, por consequência dos estragos causados por uma grande enchente do rio Tibre, uma terrível peste. Morriam inúmeras pessoas na Cidade Eterna, destacando-se entre elas até mesmo o Romano Pontífice, Pelágio II, seu predecessor.

rome.ticket

Ordenara então uma grande procissão pelas ruas da cidade; e qual não foi a surpresa dos fiéis quando avistaram, pairando ao alto do mausoléu de Adriano, o Arcanjo São Miguel! O Príncipe das Milícias Celestiais guardava sua espada de fogo, indicando, assim, que terminava o flagelo ocasionado pela peste. A partir disso, a referida fortaleza passou a ser denominada por “Castelo de Sant`Ângelo”. (3)

Por fim, ao menos nesse pequeno relato de sua vida, salta-nos aos olhos um outro marco de seu apostólico desejo de santificação e conversão das almas. Certo dia, estava ele andando pelo mercado marítimo de Roma quando, em determinado momento, avistou ancorado no porto um navio cheio de escravos provenientes das terras do norte, mais propriamente da Britânia.

No local do antigo mosteiro
beneditino erigido por São
Gregório Magno, atualmente
se encontra a Igreja de
San Gregorio al Celio

Perguntando, pois, de onde vinham, obteve como resposta que eram anglos. Como que, numa visão profética, o grande Pontífice retrucou: Non angli, sed angeli sunt!” (não anglos, mas sim anjos!). Assim, após comprar a todos esses escravos, colocou-os sob os cuidados de Santo Agostinho, futuro arcebispo de Cantuária, Inglaterra, para que fossem batizados após lhes ser ensinada a doutrina católica, com vistas à evangelização de sua terra natal e ministrado o Canto Gregoriano (estilo de canto litúrgico que leva o seu nome, cuja inspiração para as composições recebeu do próprio Espírito Santo). De tal modo isso se deu que, segundo nos narram as crônicas, mais de 10 mil neófitos foram batizados no dia de Pentecostes de 597.(4)

Enfim, que belo reflexo aqui se reporta Àquele que, como Pontífice Divino, comprou com os méritos de sua Paixão “um navio abarrotado de escravos do pecado”. Sim, éramos como mercadoria variada não fosse a Redenção. Nosso Senhor Jesus Cristo nos comprou por um preço não pequeno, mas verdadeiramente enorme: o derramamento de todo o seu preciosíssimo Sangue na Cruz! Que a exemplo de São Gregório, Santo Agostinho de Cantuária e de seus “anjos”, saibamos recorrer a Nossa Senhora, Rainha dos Apóstolos e Corredentora da humanidade, para levarmos a cabo a nossa missão!

(1) Liturgia das Horas. Tempo Comum: 18ª – 34ª Semana. v. IV, Editora Vozes – Paulinas – Paulus – Editora Ave Maria, 1999, p. 1246.

(2) Montalembert. Les moines d`Ocident, 1878,  p. 74.

(3) Obras de São Gregório Magno, BAC: Marid.

(4) Ibdem.

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Padroeira das mães aflitas

Santa Mônica, pedindo por seu filho Agostinho, junto a Santo Ambrósio

Hoje comemoramos o dia de Santa Mônica, conhecida por ser aquela que intercede pelas mães cujos filhos lhes custam muitas lágrimas… Vejamos o que o Ofício Divino nos traz a seu respeito:

Nasceu em Tagaste (África) no ano 331, de uma família cristã. Ainda muito jovem, foi dada em matrimônio a um homem chamado Patrício. Teve vários filhos, entre os quais Agostinho, por cuja conversão derramou muitas lágrimas e orou insistentemente a Deus. Exemplo de mãe verdadeiramente santa, alimentou a sua fé com uma vida de intensa oração e enriqueceu-a com suas virtudes. Morreu em Óstia, no ano 387.

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Do Livro das Confissões, de Santo Agostinho, Bispo.

Santo Agostinho e Santa Mônica – Acervo Arautos

“Estando bem perto o dia em que ela deixaria esta vida – dia que conhecias e que ignorávamos – aconteceu por oculta disposição Tua, como penso, que eu e ela estivéssemos sentados sozinhos perto da janela que dava para o jardim da casa onde nos tínhamos hospedado, lá junto de Óstia Tiberina. Ali, longe do povo, antes de embarcarmos, nos refazíamos da longa viagem.Falávamos a sós, com muita doçura e, esquecendo-nos do passado, com os olhos no futuro, indagávamos entre nós sobre a verdade presente, quem és Tu, como seria a futura vida eterna dos santos, que olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem subiu ao coração do homem (cf. 1Cor 2,9). Mas ansiávamos com os lábios do coração pelas águas celestes de Tua fonte, fonte da vida que está junto de Ti.

Eu dizia estas coisas, não deste modo nem com estas palavras. No entanto, Senhor, Tu sabes que naquele dia, enquanto falávamos, este mundo foi perdendo o valor, junto com todos os seus deleites. Então disse ela: “Filho, quanto a mim, nada mais me agrada nesta vida. Que faço ainda e por que ainda aqui estou, não sei. Toda a esperança terrena já desapareceu. Uma só coisa fazia-me desejar permanecer por algum tempo nesta vida: ver-te cristão católico, antes de morrer. Deus me atendeu com a maior generosidade, porque te vejo até como seu servo, desprezando a felicidade terrena. Que faço aqui?”

O que lhe respondi, não me lembro bem. Cinco dias depois, talvez, ou não muito mais, caiu com febre. Doente, um dia desmaiou, sem conhecer os presentes. Corremos para junto dela, mas recobrando logo os sentidos, viu-me a mim e a meu irmão e disse-nos, como que procurando algo semelhante: “Onde estava eu?”

Santa Mônica – Acervo Arautos

Em seguida, olhando-nos, opressos pela tristeza, disse: “Sepultai vossa mãe”. Eu me calava e retinha as lágrimas. Mas meu irmão falou qualquer coisa assim que seria melhor não morrer em terra estranha, mas na pátria. Ouvindo isto, ansiosa, censurando-o com o olhar por pensar assim, voltou-se para mim: “Vê o que diz”. Depois falou a ambos: “Ponde este corpo em qualquer lugar. Não vos preocupeis com ele. Só vos peço que vos lembreis de mim no altar de Deus, onde quer que estiverdes”. Terminando como pôde de falar, calou-se e continuou a sofrer com o agravamento da doença. Finalmente, no nono dia da sua doença, aos cinquenta e seis anos de idade e no trigésimo terceiro da minha vida, aquela alma piedosa e santa libertou-se do corpo.”

Texto extraído do Ofício Divino, Vol. IV, páginas 1231-1232.

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Maria vence, Maria reina, Maria impera!

Coroação de Maria – Foto: Francisco Lecaros

 

Mons. João Clá Dias

  • Como será o Reino de Maria?

Seria enganoso pensar que os eleitos, ao partirem para o Céu, dão por encerrada sua missão na terra. Pelo contrário, a verdadeira atuação dos que se salvam inicia-se uma vez transposto o limiar da eternidade. É o que Dr. Plinio Corrêa de Oliveira denominava de post história de uma alma, ainda mais substanciosa e eficaz que sua existência terrena, embora esta possa ter sido retumbante e cheia de brilho.

À vista disso, caberia nos perguntarmos: como se verifica a materna intervenção de Nossa Senhora nos acontecimentos, após sua Assunção à morada celeste?

Para o Autor, a post história da Santíssima Virgem se divide em três grandes fases: o dilúculo, a aurora e o esplendor meridiano. A era do dilúculo transcorreu dos albores da Igreja primitiva até o zênite da Idade Média. A aurora teve início com o eclodir da Revolução, [1] nefasto processo de deterioração da Civilização Cristã que desemboca nos dias atuais, marcados pelo caos, pelo ateísmo e pela extravagância. E o esplendor meridiano começará com o triunfo do Coração Imaculado de Maria, antecedido, como tudo indica, por um castigo de proporções apocalípticas.

Cabe aqui tratar sobre a última dessas etapas, ou seja, a do reinado de Jesus Cristo por meio de sua Mãe.

  • Glorioso porvir, superior a qualquer imaginação

Para o Autor, resulta impossível transmitir o que lhe vai na alma a respeito do porvir glorioso reservado à Santa Igreja durante o Reino da Virgem Celestial. Faltam-lhe palavras para descrevê-la renovada e esfuziante de graça pela ação do Divino Espírito Santo, o qual agirá em favor dela em Maria, com Maria e por Maria.

Um trecho da profecia de Baruc oferece uma pálida ideia sobre as intuições que enchem de entusiasmo seu coração: “Tira, Jerusalém, a veste de luto e de miséria; reveste, para sempre, os adornos da glória divina. Cobre-te com o manto da justiça que vem de Deus, e coloca sobre a cabeça o diadema da glória do Eterno. Deus vai mostrar à terra, e sob todos os céus, teu esplendor. Eis o nome que te é dado por Deus, para todo o sempre: Paz da justiça e Esplendor do temor de Deus!” (5, 1-4).

Contudo, o plano do Altíssimo surpreenderá inclusive os espíritos de maior descortino, pois Ele “pode fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou entendemos” (Ef 3, 20). Qualquer imaginação sobre o triunfo do Coração de Maria e do consequente enaltecimento da Igreja não passa de simples rascunho se comparada às maravilhas que o Senhor dos Exércitos operará a fim de glorificar sua Filha predileta, sua Mãe virginal, sua Esposa imaculada.

  • Anseios que antecipam a intervenção divina

Essa sublime realidade não exclui, entretanto, outra ainda mais bela, apontada por Dr. Plinio: “À medida que os justos vão gerando a ideia de como será o Reino de Maria, ele se aproxima de nós”.[2] É próprio ao profetismo não apenas prever e anunciar, mas de alguma forma antecipar e já antegozar os fatos percebidos à distância.

Elías avista a nuvenzinha – Catedral de Autun (França) – Foto: Sergio Hollmann

Ao receber a notícia de que uma pequena nuvem, com a aparência de um punho, se levantava no horizonte, Elias divisou a chuva torrencial que cairia sobre Israel e faria reverdecer o solo tornado estéril pela implacável seca com que Deus castigara por três anos os pecados do povo. Imediatamente mandou dizer ao Rei Acab que se apressasse em retornar a seu palácio, a fim de que a chuva não o detivesse pelo caminho (cf. I Rs 18, 41-46).

Ora, para além do fenômeno físico, o profeta ígneo discerniu na nuvenzinha uma pré-figura da Virgem que traria à terra outro dilúvio, não de água mas de graça: a própria Fonte Divina da graça, que redimiria o gênero humano tornado estéril pela desobediência de nossos primeiros pais. E narra a Bem-Aventurada Ana Catarina Emmerich[3] que, escolhendo três de seus discípulos, Elias os enviou como mensageiros aos pagãos do norte e do sul, mesmo ao longínquo Egito, para anunciar-lhes que se preparassem, pois estava por chegar uma Virgem da qual nasceria o Salvador dos homens.

Esse episódio mostra que, quando certas almas são levadas pelo sopro da graça a voar no firmamento da futura exaltação de Nossa Senhora, elas devem deixar-se conduzir sem receios. Embora fiquem sempre aquém da realidade, seu anseio enlevado de ver vingada a honra da Mãe de Deus apressa a manifestação da justiça e da misericórdia divinas.

Em consequência, o Autor deseja tecer algumas considerações a respeito do porvir, baseadas nos proféticos comentários de seu mestre espiritual, Plinio Corrêa de Oliveira, para, assim, incentivar as inspirações da graça que falam no interior das almas no sentido de esperar com confiança a intervenção divina nos acontecimentos, determinando o fim do domínio revolucionário e a instauração do reinado de Jesus por Maria.

  • “As almas respirarão Maria”

Na expectativa profética de Dr. Plinio, a era marial será uma época de transmissão de dádivas celestiais inéditas: “Eu espero que Nossa Senhora nos dê dons inimagináveis, superacrescidos, tão mais belos e tão mais admiráveis que os já conhecidos, que nós nem saibamos o que dizer”.[4] Ora, para se verificar tal comunicação de graças e desígnios, a humanidade deve seguir a mesma via trilhada por Maria Santíssima: a da Sagrada Escravidão.

No Reino da Virgem os homens participarão num grau altíssimo do amor que une o Divino Espírito Santo a Nossa Senhora. Segundo a expressão de São Luís Grignion de Montfort, “as almas respirarão Maria”,[5] ou seja, sentir-se-ão alvo do incomensurável e gratuito amor d’Ela e, em decorrência, A amarão com confiança, arrebatamento e carinho. Desse afeto inefável nascerá um discernimento dos espíritos mútuo, mediante o qual contemplarão umas nas outras o aspecto específico da Mãe de Deus que estão chamadas a refletir.

No entanto, isso só se realizará através de um vínculo de escravidão espiritual estreitíssimo com a Soberana do Universo, todo feito de enlevo, veneração e ternura, bem como de disposição radical para o serviço, a obediência e o holocausto. Desse modo, toda a sociedade será elevada a um novo patamar de vida sobrenatural, cumprindo em plenitude as palavras de São Paulo: “Aquele que está em Cristo é uma nova criatura” (II Cor 5, 17). No conjunto da Opinião Pública refulgirá a imagem e semelhança de Jesus, pela Mediação Universal de Maria.

Mons. João venera a imagem de Maria Auxiliadora da Casa Thabor, em junho de 2015 – Foto: Stephen Nami

  • Reino da clemência, da piedade e da doçura

Em função dessa perspectiva, como definir o Reino de Maria?

Será o reinado da clemência, da piedade e da doçura de Nossa Senhora, a era histórica na qual o espírito d’Ela estará presente em cada criatura e seu amor cobrirá, como uma névoa alva e discreta, toda a terra. Assim como nos dias atuais se inala em qualquer parte o hálito pestilento e imundo da Revolução, caracterizado pela revolta, pelo igualitarismo e pela sensualidade desbragada, durante o Reino de Maria se respirará o suave perfume da presença e das virtudes da Rainha Celestial, quer nas almas e nos ambientes, quer nos costumes e até nas civilizações.

O grande profeta e apóstolo de Maria, São Luís Grignion de Montfort,[6] explica que Nossa Senhora engendrará nas almas dos paladinos de seu reinado uma santidade tão superior, por se tratar de uma participação em suas próprias virtudes, que eles terão, na ordem da graça, a proporção dos cedros-do-líbano em relação aos arbustos se comparados aos Santos das épocas anteriores.

A esses eleitos Ela Se mostrará e Se entregará por inteiro, como jamais o fez. Haverá um momento em que cada um dos filhos e escravos d’Ela A verá como que transfigurada diante de si e experimentará as torrentes de amor e de misericórdia que emanam de seu Coração. Tudo ficará limpo, perdoado e restaurado. O Reino de Maria, realização máxima do Reino de Cristo, estará fundado nas almas.

  • Desvendar-se-á o Segredo de Maria

Tal auge de vitalidade sobrenatural fará da Igreja e da sociedade uma imagem do Corpo Glorioso de Cristo. Substancialmente será sempre o mesmo e único Corpo Místico, mas ele estará ornado de qualidades novas, as quais lhe conferirão uma luz intensíssima. De sua parte, os homens continuarão sujeitos às más tendências instiladas pelo pecado original; todavia, é de se esperar que, na maioria dos casos, estas permanecerão submissas à razão iluminada pela fé, como resultado de uma moção extraordinária da graça concedida pela misericórdia divina.

Para lograr esse grau de santificação e renovação de sua Esposa Mística, Nosso Senhor realizará em favor da humanidade algo análogo ao sucedido com os discípulos nos dias posteriores à Páscoa da Ressurreição: lhes abrirá o espírito, para que entendam as Escrituras (cf. Lc 24, 45). Desvendar-se-á então o Segredo de Maria,[7] que consiste numa verdade conhecida, mas não inteiramente compreendida e amada. Nesse sentido, Dr. Plinio afirma:

“Eu tenho a impressão, não posso ter a certeza, de que o Segredo de Maria será uma luz nova sobre uma verdade já manifestada, mas cuja interpretação saltará aos olhos particularmente nessa época da História. Tal verdade, contida na Revelação oficial, diria respeito à própria essência de Deus e, a partir dela, às relações de Deus com Nossa Senhora, com a Igreja e com todas as almas. Em consequência, o relacionamento dos homens com o Universo – no âmbito cultural, político, social e econômico – seria condicionado a fundo por esse dado novo, sobre o qual se incidiria uma luz especial”.[8]

O Segredo de Maria não se limitará, porém, à simples assimilação de uma verdade, embora ela seja necessária uma vez que não se ama aquilo que não se conhece. A clara noção a respeito de Nossa Senhora produzirá nos corações um efeito semelhante ao experimentado pelos discípulos de Emaús ao ouvirem os ensinamentos do Divino Mestre: “Não se nos abrasava o coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24, 32).

Quadro do Imaculado Coração de Maria pertencente a Dr. Plinio Corrêa de Oliveira – Foto: Divulgação

Por uma ação da graça, essa cognição virá acompanhada de um acréscimo de amor, devoção e piedade para com Ela, que redundará, conforme indica Dr. Plinio, em “uma certa união de cogitações e de vias com Maria e, por Ela, com Jesus, que nós não entendemos agora como poderá ser. Trata-se de algo sublime e misterioso”.[9]

  • Dessas graças surgirá uma nova civilização

A plena revelação desse Segredo descerrará as mentes e os corações para dois aspectos específicos de Nossa Senhora. De um lado, se verificará um enorme aprofundamento na compreensão das relações d’Ela com as Três Pessoas Divinas, como mencionado acima. À luz desse convívio, o imbricamento entre as almas adquirirá tal teor que, como explica Dr. Plinio, “se estabeleceria uma espécie de paz e de tranquilidade entre os homens, dando lugar a uma nova civilização”.[10] E, de modo especial, “se inauguraria um relacionamento com os Corações de Jesus e de Maria, marcado por uma nota de intimidade que antes não havia”.[11]

Por outro lado, em virtude de um desenvolvimento teológico favorecido por graças insignes e, quiçá, por dons místicos, ficará patente a Mediação Universal de Nossa Senhora e seu papel na salvação dos homens, pondo em relevo a superexcelência da santidade d’Ela. Como corolário, far-se-á luz sobre o enigmático processo revolucionário e os falsos profetas que o sustentam, os quais envolveram em trevas a própria Igreja.

Ressalta ainda Dr. Plinio que “essa nova compreensão abriria para os homens uma tal amplitude de graças, daria um caráter tão filial e, ao mesmo tempo, tão humilde ao vínculo com Ela, que elevaria o nível da piedade dos fiéis e, a fortiori, do clero a uma altura só vagamente pressentida pelos séculos anteriores. Assim, chegado o momento da revelação do Segredo de Maria, nossas esperanças de santidade se multiplicarão por um milhão!”[12]

Nossa Senhora do Bom Sucesso – Arautos do Evangelho

Em decorrência, o bem será exaltado como nunca, e o mal execrado até as últimas consequências. À medida que essa era abençoada progrida e se acerque de seu apogeu, estarão assentadas as bases para que a honra devida ao Criador seja dada por completo e, assim, se ponha um glorioso termo à História. ◊

Notas

[1] Pode causar perplexidade o fato de se qualificar de aurora um período que se distingue pela sistemática demolição dos valores cristãos e pela decadência da própria Igreja, ferida pelos pecados de seus filhos. Entretanto, em meio às batalhas da Esposa do Cordeiro contra a Revolução gnóstica e igualitária, despontaram varões e damas cuja virtude continha uma força e um esplendor característicos e prenunciativos de uma fase histórica de requintada santidade. São Luís Maria Grignion de Montfort, por exemplo, é um Santo que transcende em muito sua época, plenamente digno da era marial por ele mesmo anunciada.

[2] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Palestra. São Paulo, 19 dez. 1981.

[3] Cf. BEATA ANA CATARINA EMMERICH. Visiones y revelaciones completas. Madrid: Ciudadela Libros, 2012, v.II, p.316.

[4] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conversa. São Paulo, 6 jan. 1981.

[5] SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Traité de la vraie dévotion à la Sainte Vierge, n.217.

[6] Cf. Idem, n.47.

[7] Em seus escritos, o São Luís Grignion se refere à escravidão de amor a Maria por ele preconizada como um segredo revelado pelo Altíssimo de uma via segura para a santidade. Mais do que em práticas piedosas, esse segredo consiste em fazer todas as coisas com Maria, em Maria, por Maria e para Maria (cf. SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Le secret de Marie, n.1; 28).

[8] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Palestra. São Paulo, 28 jul. 1980.

[9] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Palestra. São Paulo, 30 ago. 1986.

[10] Idem, ibidem.

[11] Idem, ibidem.

[12] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conversa. São Paulo, 28 abr. 1987

 

Mons. João S. Clá Dias, EP; Revista Arautos do Evangelho, Ano XIX, nº 224,  Agosto de 2020)

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A Transfiguração de Nosso Senhor

Acervo Revista Arautos


A transfiguração do Senhor não foi somente para fortalecer na fé os apóstolos, mas todos os fiéis, incluindo cada um de nós, até o fim do mundo!


Mons. João Clá Dias

A transfiguração do Senhor nos leva a refletir sobre um dos principais mistérios de nossa Fé: a Encarnação do Verbo. Com efeito, quem poderia excogitar a possibilidade de uma das Pessoas da Santíssima Trindade unir sua natureza divina à humana, e – sem deixar de ser verdadeiro Deus – se tornar também verdadeiro Homem? Nunca, pelo simples raciocínio, nenhum homem – e nem mesmo algum Anjo – conceberia tal conúbio entre Criador e criatura. Para conhecermos esse belo e atraente mistério, era necessário que o próprio Deus no-lo revelasse.

Ademais, são inúmeros os episódios do Evangelho nos quais transparece a natureza humana de Jesus: o ter de fugir para o Egito, levado por Maria e José, a fim de poupar-se da espada de Herodes; o trabalhar como humilde carpinteiro, até os 30 anos de idade, evitando chamar a atenção do povo; o fazer penitência durante 40 dias no deserto, suportando as agruras de um terrível jejum; o verter sangue no Jardim das Oliveiras, em meio ao temor e à angústia ante a Paixão; o externar fraqueza física durante sua flagelação e enquanto carregava a cruz ao alto do Calvário. Por fim, a sua morte, como a de qualquer ser humano, e no pior dos suplícios.

Sem uma especial assistência da graça, seria inevitável para qualquer um, ao ouvir a narração desses fatos, concluir que Jesus não passava de uma mera criatura humana.

Verdadeiro Deus

Por isso, o Unigênito Filho de Deus, para sustentar nossa fé, tornou patente sua origem eterna e incriada em muitos outros fatos e circunstâncias: a anunciação à Santíssima Virgem por meio de um Arcanjo; o aviso a São José, em sonhos, da concepção virginal de Maria; a aparição de uma multidão de anjos aos pastores, perto da gruta de Belém, para lhes anunciar o nascimento de Jesus; a moção sobrenatural no interior dos Santos Reis Magos, sobre a providencialidade daquele Menino. Sobretudo foi categórica sua glorificação, efetuada pelo Pai e pelo Espírito Santo, no momento do batismo no Jordão.

O próprio Salvador, ao afirmar “quem crê em Mim tem a vida eterna” (Jo 6, 47), não fazia referência à sua natureza humana, mas sim à sua divindade. A multiplicação dos milagres, cujo auge foi a ressurreição de Lázaro, tornou a todos evidente o pleno poder de Jesus sobre a natureza.

Apesar dessas – e de tantas outras – manifestações serem mais que suficientes para levar os homens ao ato de fé na divindade de Nosso Senhor, apareceram heresiarcas a negá-la, já no começo do cristianismo. Aliás, uma das razões pelas quais São João, o discípulo amado, escreveu seu Evangelho, entre os anos 80 e 100 de nossa era, foi para reafirmar ser Jesus verdadeiro Deus. E o conjunto dos Evangelhos, procurando sublinhar a mesma verdade, por mais de cinquenta vezes dá-Lhe o título de Filho de Deus.

É necessário ter essas considerações em vista, para melhor analisarmos e compreendermos a Transfiguração do Senhor.

Acervo Revista Arautos

Conveniência da Transfiguração do Senhor

Jesus poderia ter descido à Terra acompanhado de legiões de anjos, e manifestado em todo o esplendor sua infinita grandeza divina. Contudo não agiu assim. Revelou-nos sua natureza incriada de forma progressiva, e aos poucos foi se tornando mais categórico.

Um ensino puramente doutrinário não é capaz de, por si só, mover o homem a transformar sua vida. Um antigo adágio ilustra esta verdade de modo lapidar: “As palavras comovem, os exemplos arrastam”. Sobretudo quando o exemplo é íntegro e esplendoroso na verdade e no bem, tem ele uma força tal que age sobre as tendências da alma, convidando a um certo caminho – e às vezes impondo-o.

Ao tratar da Transfiguração de Jesus, assim se exprime São Tomás de Aquino sobre essa necessidade muito própria à criatura humana: “Para trilharmos bem um caminho, é necessário termos um conhecimento prévio do fim. Assim, o arqueiro não lança com acerto a seta, senão mirando primeiro o alvo que deve alcançar. (…) E isso sobretudo é necessário, quando o caminho é difícil e áspero, a jornada laboriosa, mas belo o fim” (3, q.45, a.1, c).

Fulgor transfiguração do Senhor para suportar as agruras do Calvário

No mesmo tópico acima citado, São Tomás de Aquino continua a esclarecer, com sua genialidade habitual e sapiencial clareza:

“O Senhor, depois de haver anunciado a sua Paixão aos discípulos, con­vidou-os a Lhe imitarem o exemplo. (…) Ora, o fim de Cristo, na sua Paixão, era alcançar não somente a glória da alma, que tinha desde o princípio da sua concepção, mas também a do corpo (…). E a essa glória também conduz os que imitam seu exemplo da Paixão, segundo diz a Escritura: Por muitas tribulações nos é necessário entrar no reino de Deus. Por isso era conveniente que manifestasse aos seus discípulos a sua claridade luminosa; e tal é a Transfiguração, que também concederá aos seus, segundo diz o Apóstolo -São Paulo: Reformará o nosso corpo abatido para o fazer conforme o seu corpo glorioso. Donde dizer São Beda: foi consequência de uma pia providência que, tendo gozado por breve tempo da contemplação da felicidade eterna, tolerassem mais fortemente as adversidades” (3, q. 45, a. 1, c).

A Transfiguração do Senhor foi uma excepcional graça mística concedida aos três apóstolos escolhidos, no alto do Tabor. Sua recordação ficou como uma fonte de sólida confiança, que lhes permitiu suportar os maiores sofrimentos, pois, assistindo a ela, tiveram um vislumbre da luz plena e refulgente da eternidade.

Graças místicas

A Transfiguração de Jesus fortificou as virtudes da fé e da caridade nos Apóstolos. Enquanto a fé nos faz crer na divindade de Cristo e em suas promessas, a caridade nos conduz a uma entranhada união com Deus. São duas virtudes extremamente interdependentes. Sem a fé na esplendorosa vida eterna que nos espera, a caridade tende a desaparecer.

Mas, se a fé e a caridade dos apóstolos tanto lucraram com a Transfiguração do Senhor, não haverá algo, nessa mesma linha, que poderá auxiliar a vida espiritual de cada um de nós?

A resposta é inteiramente positiva. Deus derrama graças místicas sobre todos os que trilham as vias da salvação, em intensidade maior ou menor, segundo o caso. Mas ninguém está excluído de recebê-las. É claro que tais graças místicas não isentam ninguém de realizar os esforços próprios à prática das virtudes.

Uma transfiguração do Senhor em nossos corações

Acervo Revista Arautos

É fora de dúvida, pois, que Deus concede “Tabores”, ou seja, graças místicas, a cada um de nós.

Quem não terá sentido, alguma vez, uma alegria interior, um palpitar do coração, uma emoção calma mas profunda, ao assistir a uma bela cerimônia? Ao apreciar o canto gregoriano, por exemplo? Ou ao contemplar alguma imagem? Quiçá ao ver um lindo vitral banhado de luz, dentro de uma igreja silenciosa, que deixa lá fora os ruídos do mundo? São mil ocasiões em que a graça sensível nos visita, e nos concede contemplações interiores, prédegustações da felicidade perfeita que nos espera no Céu.

Dois Doutores da Igreja, Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, mestres da vida espiritual, dizem que a Providência costuma conceder aos principiantes, graças místicas que depois irão experimentar novamente só no fim de suas vidas. Tal proceder divino visa for­talecer essas almas para atravessarem os períodos de aridez. É um modo comum de Deus agir: dá-nos consolações – o Tabor – para, quando vier a hora do Getsêmani, termos forças, sabendo que o fim será mais cheio de alegria e esperança.

São graças que nos animam a enfrentar os sacrifícios desta vida. Trata-se de experiências místicas que nos tornam patente quanto Jesus nos ama e quer nossa eterna glória.

Assim, ao longo de nossa existência terrena, já iremos experimentando um pouco das delícias eternas, e as tendas tão desejadas por São Pedro sobre o monte da transfiguração, Jesus as irá levantando no “Tabor” de nossos corações. Para tal, Ele exige de nós apenas uma condição: que não Lhe coloquemos obstáculos.

(Mons. João S. Clá Dias, EP; Revista Arautos do Evangelho, Agosto/2002, n. 8, p. 10)

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POR QUE A VERDADE DESPERTA O ÓDIO?

Acabara de dar as razões, as provas históricas e, sobretudo, os trechos do Evangelho pelos quais a Igreja Católica é a verdadeira religião fundada por nosso Divino Redentor. Procurei ser o mais claro possível e tornar esta verdade facilmente compreensível pelo meu interlocutor.

Qual não é minha surpresa quando ouço como reação:

Você provou e até provou bem. Mas exatamente por ser verdade eu não aceito! Eu odeio a verdade! Eu quero viver como eu quero! A verdade que vá às favas!

Despedi-me o mais amável que pude, mas não pude deixar de pensar comigo mesmo: como pode ser isso? Como pode alguém reconhecer que algo é verdade e precisamente por ser verdade, odiá-la?

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A coroa do Advento

A Santa Igreja, em sua sabedoria, instituiu um período de preparação para o Natal, a fim de compenetrar as almas da importância do acontecimento e proporcionar-lhes os meios de se purificarem para o celebrarem dignamente. Esse período é chamado de Advento.

Advento — adventus, em latim — significa vinda, chegada. Designa a vinda de Cristo à terra, ou seja, a Encarnação, inaugurando a era em que vivemos e, depois, sua vinda gloriosa no fim dos tempos.

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